quarta-feira, 24 de março de 2010

O desacordo do acordo

Tirando o facto de não me terem pedido o meu acordo, eu nem estou em desacordo com o acordo ortográfico.

A minha língua tornou-se oficial por decreto do falecidíssimo D. Dinis das Naus a Haver. D. José também lá foi meter o bedelho para a tornar mais distinta do castelhano (abençoado seja, que me deu emprego). Em 1911, por a acharem retrógrada, também lá decretaram umas tantas coisitas. Durante o Estado Novo decretaram-se mais umas mudanças, por isso que mal faz mais uma e não certamente a última?

Além disso, quantas menos letras tivermos que escrever, menos erros damos, não é? Grande parte dos acentos ortográficos são já espécie em vias de extinção, por isso venha lá o acordo que me poupa trabalho na correção dos testes.

Parece-me, também, uma parvoíce dizer-se que este acordo é apenas uma cedência ao Brasil. Embora existam cedências, e qual é o acordo onde não as existem, basta olhar para o que muda para se ver que o que está em jogo é uma adequação do escrever ao falar português. Pela razão de pronunciarmos o c de facto é que vamos continuar a escrever facto. Pelo facto de não pronunciarmos o p de acepção é que o vamos deixar de escrever. Se se tratasse apenas de cedências ao Brasil, facto passaria a ser fato e aceção escrever-se-ia acepção, porque esse p, no Brasil é pronunciado. Trata-se de escrever, assim como pronunciamos, as nossas palavras.

Uma das coisas que mais me irritam neste processo é que me digam que vai ser muito difícil, que se vai dar muitos erros, que as pessoas não se vão habituar. Hoje, por exemplo, não se convive bem com o euro? Convive-se, mas antes dizia-se que ia ser uma grande confusão. Só não se muda o que não se quer mudar e ponto final.

Repare-se que este texto foi escrito de acordo com o acordo ortográfico e, por fora, não se nota grande coisa! Digo por fora porque o meu computador não achou o texto correto e queixou-se muito dizendo que se lhe complicava o sistema, que se lhe desarranjava o hábito das cores fixas para determinadas incorreções. Mas que sabe ele? Vai ao médico e pronto, que aqui mando eu!
O que interessa agora é deixarmo-nos de lamúrias e começarmos, neste tempo de habituação que nos deram, a utilizar o dito acordo. Ao escrever este texto tive dúvidas nas formas do verbo haver, nomeadamente houve e há, que optei por substituir por conjugações do verbo existir. Provavelmente, dúvidas como estas acontecerão amiúde, mas nada como o treino e a leitura do próprio para as resolver. Mãos à obra porque o que está decidido, decidido está!

14 comentários:

Carapau disse...

O que posso dizer deste post é que quem fala assim não é gaga. Se escrevesse assado seria gagá.
Quanto ao acordo, concordo contigo. Está em vigor, existe, há que aplicá-lo. Por mim ainda não o vou aplicar enquanto não arranjar um corrector (certamente já irei arranjar um corretor e nesse caso talvez me governe com o que me trata dos assuntos na bolsa...). Isto porque não sei todas as modificações que o acordo introduz e fico baralhado quando me falam em proparoxítonas e paroxítonas e fico completamente assarapantado com as oxítonas!
Uma coisa já decidi. Quando fizer os primeiros textos segundo as novas regras, não deixarei de o assinalar escrevendo no fim "Texto DaconA", significando com isto que o texto está "De acordo com o novo Acordo".
E não digo "de armonia" porque não sei se a harmonia também perde o agá ou não.

maria teresa disse...

Decidi ler umas coisitas sobre o N.A.O.e verifiquei que :
-ele apenas afeta a grafia das palavras, não interferindo nas diferenças orais, nem nas diferenças gramaticais ou lexicais.
-o critério fonético sobrepõe-se ao critério etimológico
-o alfabeto passa a ter 26 letras
-são suprimidos alguns acentos gráficos

e eu devo estar passadinha da cabeça (efeito que o Carapau, causa em mim) para estar a debitar aqui uma série de itens, que qualquer pessoa, que queira estar bem informada, pode consultar.

VOU NESSA! ACEITO O N.A.O.!!!

Calendas disse...

Carapau:

Estou mortinha por ver esses textos tão armónicos, lol.

Teresa:

Aceitas o NAO, será portanto um SIM ao NAO.

Para os dois:
hoje estava na sala de trabalho e como estava lá um grupo de profs de port., dirigi-me a elas e perguntei-lhes se o agá caía em quaisquer situações (isto por causa da minha dúvida nas conjugações de haver). Uma delas, disse k ainda não tinha lido o acordo. Outra, respondeu muito agressivamente, dizendo que não queria saber nada do Acordo e que enquanto não fosse obrigada a usá-lo, não o ia fazer. Eu respondi dizendo, cautelosamente, não fosse levar com uma cadeira, que talvez fosse altura de começarmos a estudá-lo, pq na primeira vez que o utilizei tive logo dúvidas. Ela respondeu-me que achava muito mal porque se estava tudo tão bem não via necessidade de mudar e não acrescentou nada, o que me revelou o seu desconhecimento de causa. Apeteceu-me dizer-lhe que já o zarolho dizia que "mudam-se os tempos, mudam-se as vontades" e que estagnar nunca trouxe melhorias a ninguém (além de mais um ou dois argumentos), mas calei-me.

Tudo isto para dizer que continuo sem perceber o porquê de tanta celeuma.

maria teresa disse...

Pelo que li o verbo haver mantêm-se com o "h" cai é o hífen no caso das ligações com o "de" nas formas do presente do indicativo, passará a ser hei de, hás de...mas eu não sou "perita" em português.
Penso que todos os que andam a berrar, não leram coisa alguma sobre o assunto.
Se é grave no geral, no caso de serem professores é péssimo.

Calendas disse...

Pois deve ser isso. Obrigada Teresa. Lembro-me de ter visto isso dos hifens e recordo-me de ter visto qq coisa do género. Como podes ver eu tb não estou informada, vou agora começando a ler qq coisa sobre o assunto.

Calendas disse...

Olhem meninos encontrei!

1.º O h inicial emprega-se:

a) Por força da etimologia: haver, hélice, hera, hoje, hora, homem, humor;
b) Em virtude de adoção convencional: hã?, hem?, hum!

2.º O h inicial suprime-se:
a) Quando, apesar da etimologia, a sua supressão está inteiramente consagrada pelo uso: erva, em vez de herva; e, portanto, ervaçal, ervanário, ervoso (em contraste com herbáceo, herbanário, herboso, formas de origem erudita);
b) Quando, por via de composição, passa a interior e o elemento em que figura se aglutina ao precedente: biebdomadário, desarmonia, desumano, exaurir, inábil, lobisomem, reabilitar, reaver.
3.º O h inicial mantém-se, no entanto, quando numa palavra composta pertence a um elemento que está ligado ao anterior por meio de hífen: anti-higiénico/anti-higiênico, contra-haste, pré-história, sobre-humano.
4.º O h final emprega-se em interjeições: ah! oh!

Calendas disse...

Já agora: o que é um biebdomadário?

Aceitam-se propostas, lol.

maria teresa disse...

É o que aparece duas vezes por semana, o padeiro p.ex. Lol

Carapau disse...

Confirmo as palavras da Teresa sobre o verbo haver. Afinal não sabe não sabe, mas vai sabendo...
Quanto ao H (agá)fiquei assim assim, mas aprendi mais qualquer coisinha (suponho que hamonia continua assim), agora quanto ao padeiro aparecer 2 vezes por semana, não estou nada de acordo. Gosto do pãozinho fresco, que é como quem diz ainda quente, a cheirar a forno. Vou tomar nota para qualquer dia contar umas histórias verídicas com uma padeira.
Não era de Aljubarrota mas não anda muito longe...

maria teresa disse...

Humor, hipnose, herói, homem, ...
não perdem nada.

Conta, conta,... a história da padeira... (vai sair hardcore???)

Passamos a escrever: creem, deem, leem, veem, ... sem o chapéu.

Somos muito "cultivados"...

Calendas disse...

Com isto, chegamos à conclusão que, se não queremos escrever com mais erros do que o costume,temos mesmo que começar a estudar o dito.

maria teresa disse...

Até estou a achar divertido! Será possível?

Joaquim Jorge Carvalho disse...

Quando estiver obrigado, escreverei como o Acordo determinar. Mais: ensinarei os meus alunos a escrever como diz o Acordo, assim que legalmente estiver obrigado a tal (mas vou rezando...).
Mas tenho a minha opinião (diferente da que a Anabela expressa, e que naturalmente respeito).
Este acordo é, sem dúvida, uma absoluta cedência ao Brasil. Bastará atentar no que brasileiros mudam em seu escrever e no que mudam os portugueses.É também um mau, porque falso acordo, por conter numerosíssimas excepções e admitir, em tantíssimos casos, a dupla grafia.
Prejudica o falar (e o argumento da "facilidade" significa, a curto prazo, o abastardamento completo da correcta dicção). Algumas consoantes aparentemente inúteis, no Português de Portugal, salvaguardam vogais abertas. A "recepção" dos hotéis há-de escrever-se, devido ao Acordo, "receção", mas pouco faltará para, depois, se pronunciar exactamente como "recessão". Assim eu adivinhasse a chave do euromilhões...
Os brasileiros, de facto, não têm esse problema da crescente "consonantização" da Língua. Normalmente, dão corpo, no acto de fala, às vogais existentes nas palavras. Por cá, por exemplo, já vou ouvindo "tfonaste" em vez de "telefonaste", etc.
Tirando interesses editoriais e académico-corporativos, que mal, em boa verdade, havia em que se falasse/escrevesse Português do Brasil e Português de Portugal?
Beijinho, Anabela!

Calendas disse...

Tudo bem e se calhar por não ser professora de português é que não me importo com as posteriores mudanças na escrita e, segundo diz, tb se seguirão as da fala. Na minha opinião, as vacilações entre "tfonaste" e "telefonaste" são normais numa língua que ainda não morreu. Que é a nossa língua mais do que um latim mal falado, conspurcado até ao infinito?
Não me parece que a nossa língua, com acordo ou sem ele, se manteria intacta, imutável e limpa, como guardada numa redoma de vidro.
Concordo que há politiquices e aconchegos brasileiros, mas não me parece ser só isso. De qq maneira, isto é uma opinião muito pouco fundamentada, dado que nunca me debrucei muito sobre o assunto.